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O contraditório efetivo e a vedação às decisões surpresa

Data: 30/05/2016 10:00

Autor: Luciana Póvoas*

    A Lei n.º 13.105/2015, que instituiu o novo Código de Processo Civil, traz em seu Artigo 10 a vedação expressa a que o juiz decida, em qualquer grau de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não tenha oportunizado às partes se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício.

    O dispositivo consagra o Princípio do Contraditório, assentado sobre o tripé: i. a parte tem o direito de ser informada sobre os atos processuais; ii. a parte tem o direito de se manifestar sobre os atos processuais; iii. a parte tem o direito de influenciar nas decisões do juízo.

    O novo CPC, portanto, reafirma que o contraditório há que ser efetivo e não mera garantia ilusória de manifestação.  Às partes deve ser assegurado o direito de influenciar nas decisões judiciais.

    Mas não apenas isso!

    O Artigo 10 veda a que o juiz ‘saque uma carta da manga’ e surpreenda as partes, ou uma das partes.  Por exemplo, o autor ajuíza uma ação de cobrança; o réu diz que não deve, e o magistrado profere uma decisão de terceira via reconhecendo a prescrição em sentença quando nenhuma das partes discutiu essa questão.

    Decidir de ofício significa poder conhecer de determinada matéria sem que tenha havido provocação das partes, o que não se confunde com a supressão de debate pelas partes a respeito da matéria.

    No exemplo acima pode ter havido uma causa interruptiva da prescrição, e as partes não tiveram a oportunidade de se manifestar sobre isso.

    E na hipótese, por exemplo, de manifesta incompetência absoluta, como deve proceder o juiz? Deveria intimar as partes para se manifestar em atenção ao disposto no Artigo 10, do CPC, ou poderia decidir sem ouvir as partes em reverência ao Princípio da Razoável Duração do Processo?

    A questão é polêmica.

    Há doutrinadores defendendo que em caso de flagrante incompetência e outras matérias que viabilizem o conhecimento ex ofício não seria necessário facultar o contraditório em homenagem, justamente, ao Princípio da Razoável Duração do Processo.  Outra parcela da doutrina entende ser obrigatório o debate prévio sobre todas as questões que forem decididas no processo.

    A Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados – ENFAM – editou os Enunciados de 01 a 06 sobre o disposto no Artigo 10, do CPC, dentre os quais merecem destaque os seguintes:

    3) É desnecessário ouvir as partes quando a manifestação não puder influenciar na solução da causa.

    4) Na declaração de incompetência absoluta não se aplica o disposto no art. 10, parte final, do CPC/2015.

    5) Não viola o art. 10 do CPC/2015 a decisão com base em elementos de fato documentados nos autos sob o contraditório.

    6) Não constitui julgamento surpresa o lastreado em fundamentos jurídicos, ainda que diversos dos apresentados pelas partes, desde que embasados em provas submetidas ao contraditório.

    Os Enunciados nos parecem abrir margem para casuísmos, permitindo que cada magistrado dê uma dimensão para o disposto no Artigo 10, contrariando a ideia central do novo CPC de assegurar a estabilidade das decisões, e reabrindo margem para a insegurança jurídica.

    Afigura-se mais prudente franquear o contraditório sobre todas as questões até que doutrina e jurisprudência pacifiquem o tema.

    *Luciana Póvoas Lemos é advogada, especialista em Responsabilidade Civil pela Universidade Cândido Mendes, especialista em Direito Constitucional pela Universidade Cândido Mendes e pós-graduanda em Direito Civil e Processo Civil pela Escola Paulista de Direito.

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